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AMOR EM FRAGMENTOS: UMA CONEXÃO COM ROLANDS BARTHES

  • Categoria: Cinema
  • Publicação: 11/09/2025 08:57
  • Autor: Loide Almeida

Desde pequena, eu gostava de poemas e romances, e fui crescendo com essa admiração cada vez mais intensa. Até me atrevi a escrever alguns poemas — muitos poderiam ter se transformado em canções. São memórias que, ao longo do tempo, ficaram para trás, mas sempre latentes.

Escrever é uma forma de exteriorizar não apenas emoções, mas também reações. É uma maneira profunda de eternizar experiências, seja em versos ou até em imagens. Alguns criadores se expressam na pintura, desenhando a forma amada. Tanto na literatura quanto na poesia, a escrita se torna vida, e muitas vezes se transforma em filmes inspirados em poesia. E o que dizer das canções, que surgem de uma inspiração e reverberam dentro de nós?

Hoje, tudo isso parece ter se perdido. Não fazemos mais poemas para a pessoa amada, nem escrevemos cartas. Ler um livro de poesia para muitos ficou no passado. Mas para mim não. Tento resgatar o que posso chamar de inspiração. E esta semana me deparei com um livro que me fez sentir como se alguém tivesse espionado meu coração: Fragmentos de um discurso amoroso, de Roland Barthes.

O que mais me chamou atenção foi perceber que Barthes não fala do “casal”, mas do sujeito que ama. Ele dá voz a esse eu que espera, sofre, fantasia, repete frases, se perde em silêncios e se reconstrói em gestos mínimos. Barthes não escreve de forma linear, mas em fragmentos, como se fossem pequenas confissões, lampejos ou pensamentos que atravessam alguém apaixonado. É quase cruel de tão verdadeiro. Quem nunca ficou preso na espera de uma mensagem que não chega? Quem nunca ensaiou, mentalmente, um “oi” como se fosse uma declaração?

Ler esses fragmentos é como se olhar num espelho embaçado: vemos nossas próprias inseguranças, exageros e pequenas alegrias refletidas ali. Talvez seja por isso que o livro ainda pulsa — porque, no fundo, amar sempre nos coloca nesse lugar entre a presença e a ausência, entre o riso e a angústia, entre a plenitude e o vazio.

O autor foca no "eu" que ama, não no objeto amado.

Isso abre espaço para pensar que o amor é, antes de tudo, um modo de sentir e de se colocar no mundo — e não apenas uma relação a dois. Barthes mostra que o apaixonado cria uma linguagem própria, muitas vezes incompreensível para os outros.

A leitura inspira, reconecta, ativa a memória e a criatividade. É combustível para os dias difíceis. Esses fragmentos que reverberam dia após dia nos mantêm vivos, nos mantêm ativos. 

Falamos sobre a vida fragmentada e, ao relembrar sentimentos em pedaços, refletimos sobre quem somos, o que sentimos e muitas vezes o que reprimimos. Expor um sentimento, mesmo que fragmentado, para alguns pode parecer fraqueza, mas para outros é força — é a vontade de manter vivo o que importa.

E me lembrei de um escrito meu, feito em 2015:

“Às vezes, recuso-me a dormir só para ter mais tempo de pensar em você.

Não sei se é uma obsessão ou um desejo incontrolável, mas sinto a tua falta.

Sua ausência está insuportável, difícil de suportar.

O tempo não passa, a dor não ameniza, e a solidão me domina.

Sinto-me em pedaços, espalhados por toda parte desta casa, e é difícil recuperar os fragmentos perdidos pelos cantos.” 


No fim, Barthes me lembrou de algo simples: o amor é feito mais de instantes do que de narrativas.

É no detalhe que ele acontece, no fragmento que ele se revela.

Amar é nunca se desculpar por ser quem se é – Roland Barthes