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“Unilateralismo imperial X multilateralismo democrático: duas visões antagônicas de governança planetária.

A sociedade humana permanentemente se reedifica, ora se aproximando, ora se distanciando, de formas de convivência coletivas, porque somos “seres sociais”, ora com mais autoritarismo, ora com mais democracia.
  • Categoria: Politica e Sociais
  • Publicação: 01/08/2025 09:54
  • Autor: Rodrigo Botelho Campos - economista
São espasmos civilizatórios, construídos ou destruídos pelo desdobramento das histórias das contradições movidas pelos interesses humanos: individuais, religiosos, políticos, econômicos, etc. 

Para além dos originais e primitivos clãs, com o crescimento populacional, o espalhamento sobre o planeta e o desenvolvimento das forças produtivas, se constituem novos agrupamentos, as classes sociais, como ensina K. Marx. Estas passam a dar forma à organização da vida humana sobre a Terra em diversos modos de produção que marcaram o tempo histórico, todos com uma característica comum: uma classe dominando a outra, nos diversos planos da vida, como o da política, o da economia, etc. 

Ao longo do tempo o poder político sobre as diversas formações sociais tomou a feição de império, do imperador, do indivíduo que comanda com mão de ferro, ungido por um grupo de poder, calçado por interesses econômicos, mas também político e militar. Ao longo do tempo mudou de feição, mas usarei o termo genericamente para tratar de poder autoritário, vis a vis poder democrático. 

Nas contradições da vida humana novos atores surgiram ao longo dos tempos incomodando os “donos do poder” (como ensina R. Faoro) de então. E isto gera reações, vide a história. O império romano não acabou sem reação e guerra. O império mongol, idem. O império bizantino, idem. O império otomano, idem. O império português, idem. O império espanhol, idem. O império francês, idem. O império inglês, idem. O império japonês, idem. O império alemão, idem. O império belga, idem. As guerras de libertação nacional foram expressão das lutas emancipatórias destes impérios, muitos travestidos em “democracias” ocidentais com o tempo. E suas formações mais recentes também: o império nazista, idem; o império soviético, idem. Estes impérios marcaram tempos históricos de modos de produção diversos, com classes diversas, se confundindo com elas, certamente as “de cima”. 

Contemporaneamente, os países, inclusive o Brasil, criaram ou fortaleceram organizações planetárias como desdobramento do Acordo de Bretton Woods, após a 2ª Grande Guerra. Impulso civilizatório, primórdios de um Estado planetário, para além do Império de um ou outro. 

A ONU, expressão política, o FMI, expressão econômico-financeira, o GATT/OMC, expressão comercial, são as instituições para-Estado planetário em gestação, verdadeira concertação que constituiu um novo pacto civilizatório desdobrado da maior guerra já existente que conheceu a arma nuclear, a que pode acabar com a espécie homo sapiens e a vida como a conhecemos.  

Surgiram, também, a OTAN e o Pacto de Varsóvia, alianças militares, como expressões da nova polarização pós 2ª Guerra Mundial, a “guerra fria”. 

Vieram a seguir o G7 e o G20, com o ocaso da “guerra fria”. “Estados-maiores” dos Estados. E, mais recentemente, surgiu o BRICS, sem nos esquecermos dos pactos regionais (MERCOSUL, por exemplo), expressões do terceiromundismo ou, no novo conceito terminológico: “Sul-sul”. 

Agora, os EUA, agindo como Império, com visão hegemonista de poder, num retrocesso civilizatório, saem de órgãos planetários que não dominam; enfraquecem outros que se autonomizam; atacam outros que os desafiam, tudo para tentar uma sobrevida como poder de Império, agindo como se fossem o Estado dos Estados. Algo que deveria ser papel da ONU, embrião de um governo planetário. Mas, num duplo movimento de pinça, de linha militar, atacam também os países individualmente. 

É da natureza dos que hegemonizam reagirem aos que querem emancipação, autonomia e independência. A questão crucial é que o conflito comercial é um ponto de partida. Sabemos como começa, não sabemos como termina. A história tem muitos exemplos de tragédias civilizatórias  (vide acima o declínio dos Impérios,  tornados guerra e morticínio).

Concomitantemente à política de tarifas americana, o atual governo daquele país aprovou o maior orçamento de defesa de muitos anos: US$1 trilhao. Argumento: enfrentar o colosso chinês (país do BRICS) que já aponta a constituição de uma marinha militar maior que a americana, para dar um exemplo. A “prática é o critério da verdade”: quem tem 700 bases militares espalhadas pelo planeta são os EUA, que invadem países ao longo de mais de 200 anos de história. 

Guerra comercial muitas vezes vira guerra militar. Todos os impérios que mencionei fizeram a guerra comercial como, por exemplo, no chamado período mercantilista do modo de produção feudalista em transição para o capitalismo, que era uma característica determinante. Mas o fizeram também antes, desde os gregos, fenícios, etc. 

“É a economia, estupido” (como ensina J. Carville), seus interesses de acumulação de capital, que molda o comportamento histórico das classes dominantes, nos diversos modos de produção, seus Estados, e de sua espécie autoritária: os impérios. Os EUA reagem atualmente ao crescimento do BRICS e da China, em particular. Mas a Índia, que foi o maior PIB da história no século XIX, pode voltar a se-lo. Em sua área de influência histórica, a América Latina, lembremos que “Os EUA jamais permitirão o surgimento de um Japão ao sul do Rio Grande”(como ensina H. Kissinger). 

Estes impérios de outrora expandiram pelo planeta e se apossaram de territórios, tornados colônias, com comércio, pilhagem  e guerra, inclusive o hoje Brasil, que foi colônia portuguesa por séculos, e fizeram a guerra militar, a continuação da política, como ensina von Clausewitz, para garantir seus interesses ao sul do planeta.

Os impérios mudaram de feição, retrocederam às sedes, mas dominam de outras formas, indo sempre à guerra se for preciso. O inglês/britânico, remanescente do império de colônias, ainda se auto rotula como “O império que nunca dorme”, por ter afiliados da Inglaterra à Austrália, hoje Estados de Direito Democrático, nova feição.

A guerra da Ucrânia polarizou a OTAN contra a Rússia, país do BRICS. O massacre de Gaza, verdadeiro genocidio, tem a complacência americana. Meses depois Israel e EUA atacam o Iran que é um país do BRICS. Não houve reação militar porque este bloco não é militar. É um bloco que se articula num acordo de cooperação. 

O G7 pode existir; o G20 pode existir; não são blocos militares; mas o BRICS não pode? Para a América os EUA queriam a ALCA. A reação engendrou o surgimento do MERCOSUL. A hegemonia não aceita emancipação. Há séculos a humanidade convive com estas posições de poder; subleva; se autonomiza; e surgem novos atores que querem impor sua vontade de emancipação. Exemplo da história? O gladiador Espartacus, que liderou uma revolta de escravos contra o Império Romano, Estado do modo de produção escravista, como ensina K. Marx.

Qual o grande diferencial atual: a guerra nuclear. A capacidade de “over killing” (“sobre matar”), ou seja , de destruir a Terra é maior que 1. Isto significa que os arsenais nucleares existentes podem destruir a Terra várias vezes; insanidade total, pois bastaria uma vez. 

É deste planeta, pequena bola azul no Universo, nossa Gaia, que estamos falando. É da visão hegemonista autoritária do Império de todo tipo que estamos falando. É da visão de que um outro mundo é possível, sob a égide do multilateralismo democrático para todos, que estamos falando. 

Brasil, lute por sua autonomia e independência ante o Império, qualquer deles. 

Vamos adiante, lutando!