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Anora: o fim do deleite

Crítica do longa-metragem Anora (2024)
  • Categoria: Análises e Críticas
  • Publicação: 06/02/2025 14:13
  • Autor: Bia Malamud
CONTÉM SPOILER

Situações inusitadas, brigas, gritaria e muito mais marcam o filme Anora, do diretor Sean Baker, vencedor da Palma de Ouro do Festival de Cannes. No entanto, a saga da “dançarina erótica” Ani, apelido de Anora, é muito mais do que isso. 

A história tem sido resumidamente avaliada como a da dificuldade em se ascender na vida nos Estados Unidos. Em mudar de patamar. Anora consegue ou não? Repleto de  ação e momentos hilariantes, o filme é uma mistura de drama e comédia, com excelente realização.

Nos Estados Unidos, as boates com dançarinas em estilo pornô, o equivalente aos chamados “inferninhos” aqui, têm suas regras bem definidas. As garotas dançam, algumas no estilo pole dancing, e podem chamar os homens para um ambiente privado. Nestes locais, os homens não podem tocá-las, mas colocam dinheiro em seus trajes minúsculos.

Anora é uma dessas garotas e seu ambiente é a boate QG. Ali sua rotina é retratada: sua relação com os fregueses, amizades e rivalidades. Ao voltar para casa de metrô, onde mora com a irmã, transforma-se em uma jovem comum da metrópole. E aí, o que chama atenção, é sua completa solidão.

Na boate, envolve-se com o milionário russo Ivan, ou Vanya, um garoto mimado, filho de algum oligarca importante. Ambos são jovens e passam a viver momentos de luxúria, prazer e uma verdadeira farra com os amigos com drogas, passeios e baladas. Parecem verdadeiros namorados pois convivem também com os amigos de Ivan. E começam a viver uma verdadeira fantasia. Mas não.

A curtição acaba. E quando acaba, Anora se transforma em uma verdadeira montanha russa de situações. Tal como em Boogie Nights – Prazer Sem Limites (1997), de Paul Thomas Anderson, o filme é recheado de cenas de sexo, já que em ambos os personagens principais estão na indústria do sexo, de uma forma ou de outra. Em ambos, vemos o sonho americano desabar. 

Dirk Diggler, interpretado por Mark Wahlberg, crê-se indispensável para o cinema pornô, já Anora acredita que pode conquistar um lugar ao sol ao se casar e ser amada pelo irresponsável e infantil Ivan Zakharov, ou Vanya. Os dois sofrem uma total desilusão com a ideia de que podem progredir socialmente. Mas a sociedade é realmente muito mais estratificada do que pensavam.

Mikey Madison está sensacional em todos os momentos. Uma verdadeira força da Natureza. Há apenas um ator hollywoodiano que podemos pensar quando se trata de sua interpretação. E este ator é Robert De Niro. Sim, Mikey Madison é um Robert de Niro de saias, e vamos ter ainda muitas oportunidades no cinema para apreciar seu talento.

O elenco todo está impecável com destaque para a excelente atuação de Mark Eydelshteyn como o boa-vida Ivan, responsável pelas cenas mais hilárias. E, evidentemente, para Yura Borisov, como Igor, o capanga sensível da família Zakharov. Este fala muito pouco em toda a história, mas é frequentemente focalizado pela câmera ao lado de Anora, o que, no final, faz todo o sentido. Aliás, o final do filme é um dos mais emocionantes, quando caem as defesas de Anora e ela é mostrada em toda sua fragilidade. A fantasia acabou.

Bia Malamud